terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Teresina

Meu sono deu de pesar hoje. O despertador ter tocado seis vezes e eu ter recebido quatro ligações não fizeram nem cócegas em meu repouso. Acordei na quinta ligação, de Donadora, minha senhora, perguntando de meu paradeiro. O caso é, eu devia estar na universidade às oito horas, para trabalhar de fiscal especial. O despertador deu seu primeiro toque às sete horas, tempo no qual eu acordaria, tomaria banho, tomaria café da manhã e percorreria os 150 metros que separa a república dos Bolcheviques Psicodélicos da Babilônia em Chamas da universidade local. Como sabido, os toques de nada adiantaram, e a uma hora de tempo hábil se tornou quinze minutos já de déficit. Mas tudo deu certo. Tomei a ovada de praxe, mas consegue chegar a tempo e realizar o "maravilhoso trabalho" de fiscal especial. 

É, as aspas são de ironia. O vestibular especial da UOE (Universidade Onde Estudo), é realizado pela comissão de vestibular, obviamente, mas com apoio de um projeto de deficiência. Coordenado e povoado pelo pessoal da Psicologia. Durante o ano, eles assistem filmes e discutem questões sobre as deficiências, num exemplo espetacular de perfumaria acadêmica. A única ação prática, o único momento em que é feito algo relevante é durante o vestibular. E aí que mora o problema. Parece que para eles, está bom, parece que isto basta. Eles se orgulham e se sensibilizam e acham que estão sendo caridosos e justiceiros. Mas no ínfimo não estão. Por que o vestibular adaptado é tudo menos isônomo. Ele trata igualmente os desiguais. Ler a prova para um cego não vai ajudá-lo a passar no vestibular, por que é outro modo de viver. Traduzir a prova em Libras e achar que esta ajudando o candidato é bobagem. Eles desconsideram completamente a cultura surda. O texto de hoje era particularmente complicado. Segue o link:

http://www.releituras.com/joaoubaldo_overbofor.asp

Além de ter palavras intraduzíveis para Libras, como "coevas", "vulpino", e "alimária", o cerne do texto está neste trecho:

"Uma bela vez, chegou um sem o menor sinal de nervosismo, muito elegante, paletó, gravata e abotoaduras vistosas. A prova oral era bestíssima. Mandava-se o candidato ler umas dez linhas em voz alta (sim, porque alguns não sabiam ler) e depois se perguntava o que queria dizer uma palavra trivial ou outra, qual era o plural de outra e assim por diante. Esse mal sabia ler, mas não perdia a pose. Não acertou a responder nada. Então, eu, carrasco fictício, peguei no texto uma frase em que a palavra "for" tanto podia ser do verbo "ser" quanto do verbo "ir". Pronto, pensei. Se ele distinguir qual é o verbo, considero-o um gênio, dou quatro, ele passa e seja o que Deus quiser.

— Esse "for" aí, que verbo é esse?

Ele considerou a frase longamente, como se eu estivesse pedindo que resolvesse a quadratura do círculo, depois ajeitou as abotoaduras e me encarou sorridente.

— Verbo for.

— Verbo o quê?

— Verbo for.

— Conjugue aí o presente do indicativo desse verbo.

— Eu fonho, tu fões, ele fõe - recitou ele, impávido. — Nós fomos, vós fondes, eles fõem.

Não, dessa vez ele não passou. Mas, se perseverou, deve ter acabado passando e hoje há de estar num posto qualquer do Ministério da Administração ou na equipe econômica, ou ainda aposentado como marajá, ou as três coisas. Vestibular, no meu tempo, era muito mais divertido do que hoje e, nos dias que correm, devidamente diplomado, ele deve estar fondo para quebrar. Fões tu? Com quase toda a certeza, não. Eu tampouco fonho. Mas ele fõe."

E então? O que fazemos? Eu sou partidário de repensar toda a estrutura do vestibular especial, criar uma prova específica para cada deficiência, com direito à cotas. Ou pelo menos que se discuta isso. Para os engajados alunos da UOE, está tudo certo, estamos fazendo um trabalho maravilhoso e ajudando ao próximo. 

P.S: Parece que estou descendo a lenha por que cheguei atrasado hoje e levei bronca. Não é isso, é revolta crítica-reflexiva, mesmo. Eu juro.

P.P.S: O resto do dia fiquei correndo atrás de dinheiro para receber e dinheiro para pagar. Joguei um pouco de "playdois", mas não me dou bem com ele, sou um nintendista convicto. Por fim comprei três Piauís velhas. Estou em uma fase fã de Piauí, relevo ela ser dos Salles e relevo até ser da Abril. Só não pago R$15,00 nela na banca, né, pelamor. É treiszão no sebo.

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